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REVISTA SEMANAL
PUBLICA-SE ÁS
QUARTAS-FEIRAS
ANNO I. NUM. 3.
Rio de Janeiro, 16 de Junho de 1915.
REDACÇÃO. ADMINISTRAÇÃO E OFFICINAS : RUA DA ASSEMBLÉA N. 62 - Telephone. 4136 C. - Caixa do Correio. 97
ASSIGNATURAS: Anno 18$000 - Semestre 10$000
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_ As a,,18 ° aluras » 5 ° no mínimo de 6 mezes, podendo principiar em qualquer mez, mas terminando sempre em fim de Junho ou Dezembro
CARTAS FEMININAS
Florença.
Minha cara Renata,
Decididamente tu és uma encantadora rapariga.
A tua carta que ainda rescende a camelias de Pe-
tropolis me dá a sensação de um flirt, com todas
as suas curiosidades, suas phrases curtas, a tratar
de tudo, sem fixar um assumpto, sem detalhes. Tu
és a carioca mais authentica dos meus conheci
mentos. E como eu invejo o teu temperamento pa
radoxal, a tua sensibilidade exquisita de ameri
cana!
E o Rio será mesmo a mais bella cidade do
mundo? — tu perguntas com uma ingenuidade
quasi irônica. Será?
Ás cidades, Renata, são bellas pelo que evocam
em nós de tristeza c de alegria, n’uma saudade...
Si um dia vieres até Florença, evocarás Le lys
rouge, e de memoria cada phrase será uma sau
dade, uma evocação de belleza que te ha de pôr de
joelhos, com os olhos fitos para o céo, e as mãos
cm préce.
Emquanto não vem esse dia, consola-te por ahi
mesmo, enscena tudo á tua feição para os teus
olhos e para a tua alma. E crê na belleza do Rio,
” a mais bella cidade do mundo », como eu creio
na de Florença, agora...
Porque n’esta batida do mar, Renata, o que se
procura é a mais triste, a mais do passado — Ve
ro na, a taciturna, Bruges Ia morte, Veneza a cida
de nereida...
Tu me pedes alguma erudição sobre Corot e
Ruysdaêel e o « Quattrocenio ».
Os Goncourt escreveram que em qualquer caso
sempre prefeririam um quadro de Corot a um tre
cho de paysagcm real. E Ruysdaêl, minha amiga,
é um Carot hollandez... Dize isto no teu salão, e
verás que ao dia seguinte no Senado, os velhos se
nadores não faliarão de outra cousa, senão da tua
cultura artística e do teu encanto.
Resta os « Quattrocento »... Com franqueza, o
melhor éfallares, em geral, do século XV. Si qui-
zeres, entretanto, erudição mais definitiva, procura
no teu livreiro a Vite dei pittorí, seultori ed ar-
chi tetti celebri de Vasari e serve-te á vontade. E
terás aprendido cousas mais lindas do que as que
eu te poderia dizer, embevecidamente, é certo, mas
ao acaso de uma correspondencia vertiginosa, n’u
ma hora de saudade mais próxima e commovedora
que me dão os canteiros florentinos, em Prima-
véra...
Tu me pareces disposta a grandes leituras, e eu
te felicito por isso. E também porque não queres
saber dos anarchistas russos, sem litteratura, em
bora não saiba o que entendes por isso. Todo o
anarchismo russo, Renata, é litteratura. O anar-
chista russo sem litteratura é o errante sem pão,
sem lar, abandonado á neve, aos ursos das step-