SELECTA
pelle dum christâo, custa a sabir. Felizmente ella é
moça. Isso passa. Passa — que ella nao ha de ficar
assim para toda a vida.
Mas logo uma duvida o assaltava:
— Falle compadre ? Diga o que você acha ? Por
que se ella morrer eu não resisto!
E vinham-lhe as lagrimas aos olhos, escorrendo
depois pelas erosões da face enfermiça, amiserada e
idosa.
Diante daquella dor, o Manduca despedia-se.
Montava o baio ronceiro e largava estrada em fóra,
todo pendido para diante, tristemente.
Jánas varzeas,ao choro lento do carnaúbal, diante
do sol faiscante e alto, olhando os fumos das quei
madas, longe, nas abas das serras, soltava para o ar
quente do dia a vibração sonora e lassa duma qua
dra matuta :
« Quem tiver moça bonita
Traga presa na corrente
Que eu também já tive a minha
Jacaré levou no dente. . . »
De novo entrava no mato. De novo sombras o
envolviam. Baixava a cabeça branca com um sus
piro. E o baio sentindo o desfallecimento do caval-
leiro, ainda chouteava mais devagar.
A Luiza cada vez andava mais triste. Depois do
sol posto, na curta e doce claridade do crepúsculo,
ella dava um gyro pelo campo. Seguia a estrada até
o corrego ou subia o morro, e lá de oima olhava os
tons da tarde que esmaeciam no valle, violetando
os carrascaes e os campos de plantio cheios de ru
gas. Nas varzeas passavam cicios de brizas e demo
rava no ar o arrulho gemente das pombas. Ficava
pensativa alli, no alto, muito tempo. Depois tornava
á casa, arrastando os passos. Quando passava em
frente ás Malaquias, ellas murmuravam apiedadas,
trocando os bilros.
Um dia não voltou do passeio. Procuraram-na
com fachos, aos gritos, pela catinga espessa. Muito
tarde, guiados pelo rasto, já apagado quasi do pisar
dos bichos, o Manduca e o pai acharam-n’a cahida
de costas, em cima do cerro, no mesmo logar em
que agora se levantava a cruz. Estava morta. Tinha
os olhos abertos e muito ennevoados.
Um anno depois o Estevam casára na Canoa.
Hoje em dia morava alli perto. Tinha uma fazenda
e filhos. A mulher era rica. O Selleiro ainda arras
tava a sua dôr e a sua saudade pelo mundo. Já os
bordados de suas caronas sahiam tremidos. N3°
havia muito tempo que um freguez lhe devolvera
uns arreios completos. Ia ficando cégo. Uma cata
rata pertinaz cobria-lhe aos poucos os olhos glaucos.
Arrimava-se a um jucá forte e pendia para o chão.
Dera para devoto. Vivia balbuciando preces com os
beiços molles. ■
Em tomo, na mata viçosa, a passarada cantava
alto. Gemiam aguas num marulho preguiçoso. Uma
grande frescura errava no ar. O vento trazia perfu
mes suaves de resinas. E na dormência daquella
rara abundancia sertaneja deixei cahir uma pe 1 '
gunta:
— De que morreu a Luiza ?
O pagem sorrio:
— O velho conta que foi de um ataque, mas o
povo diz que ella morreu de amor.
João do Norte
V- :i," ,|l ,v -.1
■ ■' |! ...'V ; v'M.ri 11 ' Ml , III.-.. L. 1 , . ■ : |. JU 1 .- 1 1 ' ’
A CARICATURA ESTRANGEIRA
u
<3
CL
&
1
A VIDA NO HOTEL
Garçon, o gruyere que nos serviu está todo molhado.
Está, sim; senhor ! N’este tempo o bom gruyere chora.
Ah ! ah ! Pois leve este... e traga-nos um que esteja consolado.
(Desenho de J. Henxafd)