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Alguém — um va
li- gabundo ao beber ou
os meninos, que sem
pre andam á cata de
maravilhas — quebrou
a íonte, originanidn-se
assim aquelle jorro, in
esperado, que se eleva
do fundo da terra, das
entranhas tenras e invi
síveis do asphalto. Foi
lima apparição maravi
lhosa, algo que deixou todo o mundo atto.
nito, como o achado dum thesouro. Surgiu
o jorro, inesperado, immaculado e fresco,
assim corno a primeira rima dum poeta.
Elevou-se primeiro recto e compacto, como
um grande tympano, e logo se desgrenhou
no alto, á maneira das palmeiras e dos
fogos de artificio, mas duns fogos beni.
gnos, que despediam frescura, em vez de
scentelhas inflammadas. Subia á altura das
arvores, como outra arvore desconhecida,
curvava-se no ar e salpicava-o todo com os
seus fructos de agua. Cresceu desmesura
damente num instante, como se sazonasse
de repente, ao calor dum tropico mysterioso.
E num segundo o ar se encheu de frescura,
como se uma mãe houvesse descoberto os
seus seios.
A principio 1 , toda a gente celebrou com o
seu pasmo e jubiloso assombro a creação
generosa, pois aquelle jorro era uma arvo
re a mais na grande praça, uma fonte a
mais, na cidade, alguma coisa que surgira
subitamente do nada. Paravam a olhal-o,
aparvalhados, os pares de noivos, as fami
lias e os homens solitários, prodigalizando
olhares. . Os meninos chegavam a saudar a
maravilha ; brincavam com a agua. como
brincam com os cachor
rinhos de casa e como!
brincariam com um
leão. Brincavam com a
agua ; ignorantes de
sua força, pretendiam
amansal-a e desviar suai
direcção ; e a agua, in-f
domita e innocente, mo-j
lhava-lhes os pés e ros-
to e a roupa ; brincan, fe
do com elles como a
tromba dum elephante domesticado.
Assim decorreu a pura alegria da agua.
Os vagabundos, sempre sedentos, como os
nômadas, bebiam em pé aquellas generosos
eaudaes, deixavam que aquella chuva cle
mente lhes molhasse as faces. Do regaço
das mães, os pequerruchos estendiam as
mãos, como se presentissem seios mais far
tos, despertando sua cubiça. Homens e
mulheres miravam-se mutuamente, como se
contemplassem fogos de artificio e procura
vam nos semblantes o seu reflexo. E alguns
opplaudiram.
Mas logo sentiram todos, salvo os meni
nos e os vagabundos, o susto daquella gene
rosidade espontanea da agua, e pensaram
na necessidade de conter outra vez a fonte.
Espíritos tacanhos calculavam o valor da
agua que se estava desperdiçando. Alguém
disse, sem suspeitar a belleza de sua evo
cação :
— Esta agua é um deserto!
Tãoi certo é que a agua evoca sempre,
como a rosa, a idéa do deserto, pois é alli
onde uma e outra alcançam seu apogeu má
ximo. Na verdade, aquelle jacto parecia a
juba desgrenhada dum leão. E o publico