Full text: 2.1923=Nr. 9 (1923000209)

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PELO MUNDO... 
¿V 
ir. 
scena acostumada. As Langas, por exemplo, 
são um cannavial; os personagens desappa- 
receram ; o céo é o mar Mediterráneo; e o 
conjuncto do quadro, emfim, em vez de re 
presentar urna scena histórica, cheia de per 
sonagens e de soldados, mudou-se em pai- 
zagem meridional, um aspecto sob o qual se 
desconhece Velasquez, salvo nas duas paiza- 
gens da Villa Medieis. Que dirieis então ? 
Então, e não antes, é que nós, homens da 
rúa {the man in the Street, como dizem os in- 
glezes) admiraríamos deveras Velasquez. Que 
genio estupendo! Chamal-o-iamos de precur 
sor, e a theoria da relatividade (digo da re 
versibilidade) se apreciaria num exemplo his 
tórico. 
Pois essa é a pintura reversível. Uma pin-' 
tura que, no mínimo, representa dous assum 
ptos e não um só (ou ás vezes nenhum); uma 
pintura que póde satisfazer dous temperamen 
tos differentes, á diversidade dos assumptos, 
do seu estylo, de sua tonalidade; urna pintura, 
afinal, que não é mais «urna pintura», mas 
duas, e que poderá ser collocada, segundo as 
circumstancias, ora de cabeça para cima ora 
para baixo, que poderá variar a decoração de 
nossos salões de um momento para outro; uma 
pintura dupla que servirá ao mesmo tempo 
para ¡Ilustrar e para divertir por partida do- 
orada ao espectador. Sentimo-nos tentados a 
dar a formula mathematica da nova theoria 
ei-la: 
□ 2 
Não nos resta senão ¡Ilustrar com alguns 
exemplos graphicos, como prova evidente de 
que não falamos a esmo, mas que sabemos 
«realizar» as mais estrambóticas theorias, do 
momento que tomamos a penna, afim de espa 
lharmos a boa nova. 
O leitor não imagine que os desenhos que 
¡uustram este artigo tenham malicia nem outra 
intenção que a que se deprehende á primeira 
vista. Assim, por exemplo, o grave juiz inglez, 
com os seus oculos e peruca, póde ser toma 
do por simples debique á magistratura ingle- 
za; e a caricatura alvar, a alegria do theatro— 
do mau theatro. Porém ha mais alguma cousa: 
‘Omae o trabalho de contemplar estas e outras 
"guras de cabeça para baixo, e vos conven- 
fereis que ha outra cousa mais. O nariz do 
juiz se transformou em barbica de outro per 
sonagem, e quanto á caricatura, se mudou em 
«ansarina. E examinando um por um estes 
desenhos, verificamos que significam duas 
ousas ao mesmo tempo, e ás vezes, (a maio- 
*ia), duas cousas muito diversas. 
Estas figuras não são mais que a illustra- 
çao de nossa theoria, desenhos (seja dito com 
licença.do desenhista) cuja pretenção não foi 
senão de apresentar esta theoria de um modo 
satisfactorio. 
Imagine o leitor que partido poderá tirar 
dessa theoria um pintor genial que não se 
dispõe de traços mas de tintas, e que não so 
mente pinta retratos mas paizagens ou scenas 
das mais complicadas. 
Ahi está a idéa com que presenteamos um 
futuro chefe de escola, algum talento novo e 
de progresso, que queira fazer caminho para 
deixar o seu nome á posteridade. 
E para concluir, diremos que a idéa da re 
versibilidade na pintura póde ser multiplicada 
e elevar-se á ultima potencia, ou no minimo á 
quarta potencia, isto é, adoptando pela segun 
da vez a formula mathematica. 
U 4 
Porque se é exequível, como ficou demons 
trado, que um quadro póde representar dous 
assuráptos, f evidente que a theoria applica- 
da por um pintor ou genial desenhista possa 
quadruplicar-se, e dar a um quadro quatro 
significações, correspondentes á sua posição ao 
canto de cada um dos lados. 
Muito tem dado que falar a theoria da «re 
latividade de Einstein», e na opinião unanime, 
ninguém a entendeu. 
A idéa da «reversibilidade», que preconisa- 
mos, não quer revolucionar a sciencia, mas 
áim a arte, e é evidente que todos a podem 
comprehender, embora só um ou outro talento, 
mais ou menos impressionável e accessivel ás 
novas idéas, a possa por em pratica. 
O naturalista inglez, sir John Lubock, asse 
gura que a aranha é de todos os animaes 
a que mais come, proporcionalmente ao seu 
tamanho. Pesou varias aranhas, antes e depois 
de terem comido, e tirou a conclusão de que 
se um homem quizesse comer uma quantidade 
de alimento proporcional á que comem aquel- 
les animaesinhos, teria de devorar, em cada 
vinte e quatro horas, duas vaccas, treze car 
neiros, dez porcos e quatro toneladas de peixe. 
Sç considerarmos quanto os conhecimen 
tos litterarios dilatam os limites da intelligen- 
cia e quanto elles multiplicam, ajustam, recti 
fícame arrumam as idéas, reconheceremos 
sem °ifficuldade que são equivalentes a um 
sentido addicional; offerecem prazeres que a 
riqueza não póde dar, e que a pobreza não 
pode tirar completamente.
	        
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