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PELO MUNDO...
mettida numa delias, admirando o seu effeito.
Porém ella sorriu ao seu ar desapontadoi.
— Olha, disse ella resplandecente de pra
zer, isto pertenae a íjninha amiga Mary Cartón.
Ella emprestou-me hoje á noite. Não' achou-o
a seu gosto depois de comprai-©' e quer ven
dei-o a inim. No 'meu lugar tu o comprarías ?
E’ um bom negocio.
Elle concordou e ainda mais offereceu
dar-lhe alli mesmo as dez libras e ir pagan
do o resto. O casaco fôra avaliado por uma
amiga em vinte libras. Marjorie acceitou o
dinheiro constrangida; então, debulhando-se
em lagrimas, lançara-se aos seus braços.
Como elle tinha um compromisso no seu
club, não podia ficar com ella, como 1 ella
lhe pedia. Havia beijado as lagrimas e ar
rancado se partira. Ouviu-a soluçar baixinho
quando a porta devagar fechou-se, tapando
o rosto todo 1 lacrimejante.
Quando recordou o seu vehemente pro
testo, de não acceitar o dinheiro, elle sorriu.
«A rapariga é de bem» pensou elie orgulhoso.
Mesmo apezar de sermos noivos tive que
forçal-a.
Quando o seu pensamento chegou a ulti
ma scena da vespera á noite, o bonde estava
fora da cidade.
Alguns operarios apearam a uma fabrica
perto" e elle achou lugar para sentar-se.
Abrindo um jornal da manhã, percorreu a
pagina dos annuncios. E alli, pela primeira
vez, deu com uma offerta que o podia tirar
da vida de fabrica.
Precisava-se de um homem com experi
encia de fabrica e de guarda-livros. Elle pos
suía ambas. Era uma opportunidade. Con-
seguil-o-ia ?
‘O bonde approximava-se dá fabrica e as pa
lavras do lojista occoirreram ao seu espirito..
«Durante vinte annos trabalhei na mesma fa
brica. Então, resolvi...
Faltavam cinco minutos para sete. O bonde
parou ao portão e elle apeou. Já os opera
rios corriam apressados a occupar os seus ban
cos. Junto do portão estava o vigia prompto
a fechal-o ao ultimo som do assovio. Isto faria
com que os retardatarios tivessem que passar
pelos escriptorios onde pudessem ser regis
trados.
As afflicções da vida de escravo patentea
ram-se a este lutador que almejava a liber
dade, quando viu a ancia dos companheiros
para occupar os seus lugares junto das machi
nas.
«E atirei á sargeta o almoço»... parecia-
lhe ainda ouvir-lhe as palavras.
Dando um ultimo olhar aos companheiros,
elle deliberadamente atirou o pacote conten
do o seu almoçrí á rua, e virou as costas ap
portão.
Emquanto esperava o bonde que o levaria
ao centro da cidade, elle percorreu a primeira
pagina do jornal, o seu olhar agora era de
homem independente, representado por um
nome e não por um numero.
Na nova sensação de respeito por si mes
mo, os seus ouvidos permaneceram surdps ao
assovio que dava o aviso de tres minutos
antes das sete.
Continuou vagaroso a percorrer com o olhar
a pagina. Então, estacou, lendo espantado um
curto paragrapho.
«Em consequência de diversas queixas, _ a
policia fez uma investigação hontem á noite
no Fuller Hotel. Evidentemente, os muito co
nhecidos frequentadores estavam avisados, por
que não se achou nenhum. Comtudoi, uma
chamada Marjorie Thompson, operaria de fa
brica, foi presa conjunctamente com um muito
conhecido jogador. O homem em questão é
de indesejável reputação, pois a policia anda
vigiando os seus gestos desde algum tempo.
Falou com ar sarcástico quando se indagou
delle a respeito da rapariga.
— Porque não estaria ella comsigo ? es
carneceu elle. O casaco de pelliça que ella
usa foi eu que lhe comprei. Não a forcei estar
commigo.
Os olhos do leitor, empanados de lagrimas,
fixaram-se apatetados na rua. Inconscientemen
te ¡seguiram um bonde que via correndo na sua
direcção. A idéa de livrar-se do soffrimento
pelo suicidio occorreu-lhe.
As rodas seriam cruéis no momento, mas
depois teria repouso. Esperou até o bonde
chegar bem perto, então, resmungando umas
pragas sem nexo, atirou-se á frente do vehí
culo. O motorneiro viu o desesperado movi
mento e fez funccionar os freios.
E passou a occasião. O operario fez. signal
ao carro que seguisse, e, com um sorriso dé
bil, recuou.
Deu com o olhar no almoço atirada ao
chão; e virando e olhando para a fabrica
viu os últimos chegados que se apressavam 1
para a tarefa monotona do dia.
Então, vencido, acabrunhado, escravo das
circumstancias, apanhou furtivamente o des
prezado alimento e correu. O ultimo asso
vio silvava quando o vigia trancava o por
tão atraz delle.
Havia quasi alcançado o seu departamento
na fabrica quando uma rapariga, com o rpsto
livido de chorar, correu ao seu encontro^ Re
conheceu o rosto todo molhado de lagrimas
de Marjorie.
— O’ Jack ! disse ella desatando em so
luços, correndo para elle e agarrandorse ao
seu braço, que horror !
Ella enxugava os olhos com o lenço, ao
passo que elle procurava as palavras de des
prezo para lançar-lhe em rosto.
— Que... gaguejou elle.
— Uma rapariga qualquer foi presa no
Fuller Hotel a noite passada e deu o meu
nome no lugar do delia. Vou direito ao jornal
para desmentir e dizer que não fui eu.
A resposta delle foi absolutamente inespe
rada. Com um gesto de alegria lançou por
cima do gradil da fabrica o pacote contendo
o almoço.
— Porque fez isto ? perguntou ella curiosa.
Já foi dado o ultimo assovio,
— Ha um emprego offerecido na cidade,
disse elle todo alegre. Vou obtel-O. Tem
razão quanto ao assovio. O ultimo assovio
acaba de silvar para nós dois.
A mão delia passou teob o seu braçoi e foi
agarrada com mão firme.
— Não comprehendo, disse ella, com um
sorriso confiante substituindo as lagrimas.
— A minha mulher não trabalhará nunca
na fabrica, disse elle resoluto.
Ella comprehendeu. De mãos dadas elles
transpuzeram o portão.