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PELO MUNDO...
ções, e quem remexe o leito de tanque esta
gnado para tr.azer á superficie o que está no
fundo, faz surgir dali redemoinho fervido de
imagens. Tudo que tem relação com a idéa, e
pode enriquecel-a e alimental-a, e formar
corpo com ella, e destacar o seu relevo, e
reforçar a sua côr, tudo desperta e obedece
ao poderoso esconjuro. Mil recordações do
thesouro de observação consciente e incon
sciente que armazenou na existencia aventu
rosa, mil notas de sua sciencia do mundo,
acudiram ao pensamento de Cervantes,
para reunir-se ao esboço que concebeu de
seu heroe, para accrescentar-lhe um toque
de verdade e de vida. Essas lembranças, es
sas representações, são as partículas de pe
dra que dos ambientes do mundo, concorrem
FIGURAS DA TELA
Patsy Ruth Sfiller, a deliciosa estrella, cujo ul
timo éxito foi “O corcunda de Nossa
Senhora”’
para reconstruir o semblante da estatua, para o
contemplador deante delia em muda expe
ctativa. Talvez se esforce em luta a alma
do artista nesse momento da concepção; tal
vez se afflija na impaciencia de evocar to
dos os elementos que o interessam e fazem
falta, assim como ardia em ancia e penas de
amor a contemplação do eremita. Não lhe
basta rebuscar no accumulo de recordações,
mas, ao passo que o preoccupa o precioso
germen que traz nas entranhas, tem os
olhos attentos para a realidade, afim de lhe
dar novos traços de expressão, e embeber
se nos vivos reflexos de sua formosura, ao
modo como a mãe antiga em expectativa de
maternidade, se cercava de fôrmas perfeitas.
Não lhe basta também recordar e observar,
mas precisa meditar sobre o recordado e ob
servado, de sorte que a inconnexa pluralida
de das imagens se traduza em synthese har
moniosa. Porém, a meditação, que dirige e
coordena a ordem que a meditação produz
%
na obra de fantasia, também não basta.
Nunca passaria essa ordem de ordem lógica,
de disposição artificiosamente calculada, se
engrandecendo o acerto com que o compõe
o raciocinio, não perseverasse a inconscien
te força do amor, que como calido sopro
plasmante, circula por entre as relações e
juntas que a mente estabelece. E nunca che
garia “viver” o personagem imaginario,
nunca a sua imagem se moveria com vida
pessoal e enérgica comparável á dos cara
cteres mais individuaes que vemos na reali
dade, se o amor do artista chegando ao seu
mais alto ponto, ao extase em que culmina,
inspirado e triumphante, congregando num
rapto os elementos que poz de accordo,
compenetrando-os e traspassando-os, comp
que por um golpe intuitivo na ¡Iluminação
divinal, não suscitasse finalmente a visão
única, simultanea, completa, da creatura de
sonho: a allucinação que a põe em pleno
sol da consciencia do artista, e depois da
qual, não é preciso senão a vontade que
execute e a mão que obedeça. Quando a
chama de amor, transbordando dos olhos
que almejam a suspirada fôrma, colheu na
nuvem fluctuante onde a procurou, a ima
gem é de definitiva fôrma, com vida immor-
tal. A virtude plástica da concepção, depen
de da efficacia deste utimo acto instantâneo
e insubstituível, no qual os que o' precede
ram, acham a sua recompensa e fructo.
E’ tudo prezidido por uma mesma força
na actividade creadora da imaginação: o
primeiro desejo que excita á realização da
belleza; a evocação enérgica e tenaz que
congrega os elementos com que a compoz;
a inspiração que vivifica e também a obsti
nação e perseverança da vontade. Tudo é pre
zidido por uma só força: a mesma que, cha
mando af finidade, produz ás' fôrmas har
moniosas dos crystaes, as estrellas e' hexá
gonos nos quaes se coalha a neve; e cha
mando-se attracção, rege o sublime accordo
dos mundos; e chamando-se amor dos sen
tidos, reproduz a proporção e belleza dos
seres vivos; e chamando-se amor desinte
ressado e ideal, floresce na divina formosu
ra das cousas de arte.
Hpparelhn interessante
Um homem de sciencia americano, o
dr. W. W. Cobentz, af firma que se se pu
desse concentrar sobre um dedal cheio de
agua todo o calor que nos chega das
estrellas, ellas gastariam dois séculos em
levar o liquido ao ponto de ebulição.
Esse mesmo doutor aperfeiçoou um ap-
parelho para medir o calor, podendo com
elle determinar que o calor irradiado por
uma estrella é tão insignificante, tão infi
nitesimal que levará um milhão de annos
o raio de uma estrella a esquentar um
volume de agua equivalente ao de um
tostão de nickel dos pequenos.
O apparelho em questão mede o calor
de uma vela a dois kilometros de dis
tancia.