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PELO MUNDO...
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I N O,
e: seu o a va l. lo turv
Pepino, o Breve, é o correio de São
Lourenço.
A’ primeira vista pode parecer paradoxo
que se pretenda app'ór o cognome de «o
Bréve» a qualquer correio do mundo, mór-
tnente ao flo Brasil, onde o serviço postal
está affecto ás attribuições do Estado.
Ora, desde que o mundo é mundo, sempre
que a preguiça humana se mancommuna com
a . funcção burocrática para realizar um ser
viço que implica actividade e presteza, este
tende fatalmente a ser de urna irritante mo-
Tosidade. E se assim íé a leí que rege a
sorte dos correios sob ( o contróle do Es
tado, como e por que rebentou, no meio
desta modorrenta engrenagem, um estafeta
com o nome cadastral de
Pepino, o B reve ? Será esse
«ppellido um travo de iro
nia?
Não. Os mineiros são gen
te de uma simplicidade dul
císsima; e quando se des
contentam d'alguma casa, ou
choram rimas primorosas, co
mo faz o Belmlro Braga, ou
dependuram-se mcomtnoda-
mente de um'a corda official,
c°mo o fez Tlradentes.
Os mineiros, dentro de sua
sinceridade sertaneja, ou
a mam com enthusiasmo, ou
desprezam com discreto si-
len
%
cio, ou reagem com altivez
desassombrada. A ironia, es-
56 requinte virulento do genio
urbano, ainda não contaminou
us aguas de São Lourenço.
r~°go, não ha perfídia em-
.rada no cognome de Pe
pino.
Então como se justifica tal epitheto?
Como admittir que dentre o milhão de
Estafetas que por ahi pullulam, na sua quasi
°taliüade humanamente burocráticos e buro
cráticamente lérdos — surja um Pepino sin-
|t.lar, que mereça e alcance o appellido «o
“réve» ?
E motivo é simples: é que entre a boa
a tenção humamssima do honrado Pepino e
a essência burocrática de seu cargo, medeia
penas esta coisa que não é humana nem
Urocratica — medeia o Tupy.
O Tupy é o cavallo dò Pepino, o Breve.
Sempre que o homem resolve elevar-se aci
tu ao nível de seus eguaes, trepa no dorso
um cavallo. Assimi o fizeram Attila, Na-
^°teão, Frederico II, D. Quixote e Pepino,
Bréve, o correio equestre de São Lou-
ctiço. Que sena de Pedro I, se não fôra
^uell e cavallo de bronze que elle monta,
de^ caboclos e de feras, no largo
Rocio ? v Com aquelle papelucho na mão,
pareceria antes um leiloeiro que um liberta
dor de povos.
E eu, do retiro do meu quarto de hotel,
ao ver, á hora do sol poente, a estranha
silhueta daquella ossatura ambulante, que ser
ve de montada ao bom, ao honrado Pepino
— eu pretendo haver comprehendido toda a
ímmensa tragedia que deve ,ter sido a vida dos
Rocinantes, dos Bucephalos e dos Tupys.
Quando eu te contemplo de perto ó meu
magro e exceliente quadrúpede, julgo des
cobrir na profunda. transcendencia de teu
olhar de cavallo a resignação buddhistica e
sabia com que acceitas o destino da tua es
pecie. Como eu te venero, meu magro e ex-
cellente Tupy. Ha oito longos annos traba
lhas surdamente ao serviço
da mala-posta, levantando
com os teus combalidos pás
o pó das estradas de barro
vermelho, sob o peso buro
crático de teu boníssimo do
no; e nem por isso conse
gues contar tempo para a
vitaliciedade de teu cargo,
nem para os effeitos duma
justa aposentadoria: E no
meio de toda a indifferença
dos «aquaticos» de São Lou
renço pela grandeza de tua
resignação de cavallo, só
mente uma voz humana te
consola: é a voz de Pepino,
o Bréve, o teu honrado e
carinhoso dono.
Pepino é, em verdade, o
teu maior amigo; e com isso
não faz mais do que pagar
a fidelidade que lhe consa
gras. Pepino pleiteia, junto
ao Parlamento Nacional, por
intermedio do Ephigenio de Salles, vezeiro
«aquatico» de São Lourenço, a votação de
uma verba addicional para melhor sustento
e trato de tua carcassa, ó meu velho e
magro Tupy:
Fica, pois, sabendo, ó Tupy, que de hoje
em deante, além' da solidariedade de teu
honrado dono, podes ainda contar com o
meu fraco mas sincero apoio, desta sacada
d’O JORNAL, á tua promoção a funccio-
nario effectivo do Correio Geral do meu
paiz.
Mas, por Deus, não te burocratizes; con
serva-te integralmente cavallo: "Não te hu
manizes, para bem do serviço postal de São
Lourenço e para segurança da propina de
teu boníssimo dono, este singular correio
equestre que se chama Pepino, o Bréve.
Mendes Fradique.
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