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PELO MUNDO... Maio de 1928
f>ie:dade: filial —i
O Brochado veiu rapazito para o Rio de
Janeiro e saltou ali com o pé direito, por
que estava primeiro caixeiro, com caderneta
na Caixa Económica em pouco tempo.
Considerava-se feliz; só uma coisa o af-
fligia:
A saudade do pae que deixara na aldeia.
Um dia em que, passando por uma loja
da rua do Ouvidor, viu exposto um retrato
a oleo, lembrou-se de mandar pintar o do
velho, afim de pendural-o defronte da cama.
Não podendo ter perto de si a pessõa,
queria ao menos a imagem de seu pae.
Brochado informou-se da residencia do
pintor e foi ter com elle.
— Vinha pedir-lhe que me pintasse o re
trato de meu pae... Mas não queria coisa
que me custasse mais de trezentos mil réis.
E’ quanto posso pagar.
— Está dito! onde está o s'r, seu pae?
— Em Portugal.
•—Elle está ausente? E’ pena, porque pião
gosto de fazer retrato senão deante dosí res
pectivos modelos. Etnfim, como não ha re
medio...
— Faz o retrato ?
— Faço. Queira mandar a
photographia.
— Que photographia?
— Do sr. seu pae.
— Não tenho.
— Oh! N ão tem photo
graphia?
— Não senhor !
— Tem então um desenho ?
Um retrato qualquer do sr.
seu pae?...
— Retrato deve o senhor
fazer-m’o.
— Mas... o senhor não
tem outro pelo qual cu possa
copiar o meu?
— Não, senhor; se eu ti
vesse o retrato de m«u pae,
não lhe encommendava ou
tro ; bastava-me um!...
—■ O senhor suppõe que eu
seja um telephotographo ?
— Um quê?...
— Como quer o senhor
que eu faça o retrato de
uma pessõa que não conhe
ço, que nunca vi e que não
está presente?
— Dar-lhe-ei todas as in
formações necessárias.
O pintor comprehendeu en
tão que espede de homem
tinha deante de si, e lo
go pensou em ganhar os
3008000 que estavam ganhos.
— Pois bem disse elle, va
mos ás informações.
— Meu pae chama-se Fran
cisco Brochado.
— O nome não é preciso.
— E’ viuvo.
— Adeante.
— Tem coisa de 50 an-
nos. E’ alto, magro, -bar
bado, louro e corta o ca
bello a escovinha. Eu me
pareço com elle.
— E’ quanto basta, disse
o pintor.
Daqui a tres dias póde mandar ou vir
buscar o retrato.
O Brochado filho saiu e no dia aprazado
lá estava na casa do artista.
— Ali tem seu pae, disde este apontando
para um retrato, que estava no cavalfcfe.
O Brochado approximou-se, te,-e um gesto
de surpreza e levou muito tempo a olhar
para a pintura.
Depois, as lagrimas começaram a deslizar-
lhe pela face.
:> PINTURA ALLEMÃ C
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O retrato d; "Lady Vause’’, por Hans Holbein, o primeiro pintor
allemâo do seu tempo (1497—1543).