Full text: 1.1915,28.Jul.=Nr. 9 (1915000109)

SELECTA 
— Vem ver. Sabes que é? 
E o pae apontou com o dedo para um riacho 
de luz rosa no céo, bem no horizonte, para 
os lados do sul. 
— E’ prenuncio do sol... Amanhã ou depois 
d’amanhá, nos veremos provavelmente o proprio 
sol. E olha a extranha luz vermelha no cume do 
Rastekai's. 
Sampo voltou-se para o oeste. 
Com effeito, de longe no cume sombrio, a ne 
ve brilhava com reflexos vermelhos. 
Essa visão excitou-lhe de novo o desejo de ver 
o rei dos Trolls. Pensou n’elletodo o dia; á noite 
o somno fugiu-lhe. 
— Não, decididamente, é preciso que eu veja 
esse rei poderoso, disse elle para si mesmo. 
E, sem ruido, deixou a sua caminha quente, e 
sahiu. 
Fazia muito frio; a neve rangia sob os seus 
pés e as estrellas scintillavam. Mas Sampo não era 
_ _ friorento. Tinha vestido 
casaco, calças e uma pel- 
liça. Trazia botas e gorro 
de pelle de renna. 
Olhou para as estrellas 
como para pedir-lhes 
conselho. Mas quando 
ouviu mover-se a sua pe 
quena. renna atraz da 
choupana onde estava 
amarrada, não hesitou 
mais. Depressa, atrelou-a 
ao seu trenó, e partiu na immensidão branca, que 
brilhava como diamante. 
As patas da renna tocavam apenas no chão. 
Sampo, encantado, poz-se a cantar. 
De repente avistou lobos cinzentos, do tama 
nho de cães, que corriam no seu encalço. 
Mas Sampo não teve medo. 
Sabia muito bem que elles não podiam alcan 
çar a sua renna, que voava como uma flecha, pu 
lava por cima das fendas das pedras, mesmo dos 
arbustos. Proseguiam assim no seu caminho sem 
retardar a marcha. A lua corria com elles e as 
altas montanhas também no sentido inverso! 
Como era divertida a carreira vertiginosa! De 
repente, a uma volta brusca do caminho, o pulka 
tombou e Sampo cahiu na neve! 
A renna não viu nada e continuou a galopar. 
E o pequeno Sampo ficou sósinho no immenso 
deserto, onde nem um ente vivo o podia ouvir. 
Um pouco assustado, elle poz-se de pé; mas não 
desanimou. Ah! não! 
Era corajoso! 
Depois de ter sacudido a neve que o salpicava 
de branco, procurou orientar-se. 
Por toda a parte eram só planicies de neve; e, 
bem na sua frente, levantava-se ameaçador o 
monte Rastekais. Era acolá que morava Husi, o 
papão das creanças. Então, teve medo e lastimou 
ter de : xado a choupana e os paes. Como se sentia 
só e abandonado no meio d’essas montanhas se 
veras, no silencio profundo, na escuridão que o 
cercava! Pobre Sampo! Nem mesmo podia 
chorar, pois as suas lagrimas gelavam e cor 
riam-lhe no rosto como bolinhas 
correndo pela pelliça abaixo. 
— Serei um covarde ? 
perguntou elle emfim 
humilhado. Eu, Sampo 
Lappelill! Se eu ficar 
aqui me vou tornar uma 
verdadeira pedra de gelo. 
E’ melhor ir de uma vez 
á casa de Husi, rei dos 
Trolls. Tanto peior se 
elle me comer. Entretan 
to, aconselho-lhe que 
coma primeiro os lobos; ~ " 
são mais gordos do que eu. 
geladas] es- 
* * * 
De repente, ouviu passos surdos na neve, junto 
d’elle. Era um lobo que arreganhava os dentes! 
Sampo estremeceu. Mas em breve dominou o 
seu terror, e, sobranceiro, fingiu-se indifferente: 
— Não te incommodes, lobo velho! gritou-lhe 
elle. Tenho um recado a dar ao rei dos Trolls e 
ai de ti, se me tocares! 
— Bem, bem, pequeno, rosnou o lobo, (pois 
em Rastekais os bichos faliam). Quem és, me 
nino? 
— Eu sou Sampo Lappelill. E tu? 
— Eu sou o mestre das cerimonias de Sua Ma- 
gestade o rei Husi, respondeu o lobo arregalando 
uns olhos terríveis. Acabo de convidar todo o 
povo á festa do Sol. Monta nas minhas costas e 
levo-te á presença do rei. 
Sampo não recusou um convite tão amavel; e 
montou nas costas do lobo, segurando-se no seu 
pello vasto. 
Galopavam por cima dos precipicios, das fen 
das, pulando de pico em pico. 
— Que é a festa do Sol ? perguntou Sampo. 
— Não o sabes? replicou o lobo admirado. 
Quando o sol reapparece, depois da longa noite 
do inverno, nós celebramos a sua resurreição. To 
dos os bichos e todos os Trolls são convidados a 
Rastekais, e, esse dia, ninguém tem o direito de 
fazer mal algum a quem quer que seja. Tens sor 
te Sampo Lappelill; senão já te teria comido! 
— O rei dos Trolls, observa também essa lei? 
perguntou Sampo com prudencia, tremendo de 
medo. 
— Naturalmente. Uma hora antes do nascer do 
sol e uma hora depois, ninguém, nem mesmo o 
rei te ousará atacar. Mas cuidado! Pois, se pas 
sada a hora ainda estiveres nestes sitios, cem mil 
lobos e mil ursos atirar-se-hão sobre ti. O proprio 
rei apoderar-se-á de ti, se quizer.
	        
© 2007 - | IAI SPK
Waiting...

Note to user

Dear user,

In response to current developments in the web technology used by the Goobi viewer, the software no longer supports your browser.

Please use one of the following browsers to display this page correctly.

Thank you.