Full text: 1.1915,4.Aug.=Nr. 10 (1915000110)

SELECTA 
O homem bO$ peixes Conta-se que Moysés 
Samama, vindo da ilha 
de Gerbi para Tunis ha 
uns duzentos e cincoenta annos, encontrou no mer 
cado um arabe rico, mas celebre pela sua avareza, 
comprando um peixe grande a um pobre pescador 
ambulante. O astuto judeu concebeu ¡inmediatamente 
o intento de comer a sua parte d’aquelle saboroso 
bocado, e seguiu de longe o arabe que voltava de 
pressa á casa. 
D’aiii a pouco, um appetitoso cheiro de peixe frito 
passava peia porta entreaberta; e o judeu sentindo 
cócegas no estomago, tomou coragem e bateu á porta 
do avarento annunciando-se como «hospede de 
Deus ». 
Os arabes fanáticos e ferozes praticam rigorosa 
mente a virtude da hospitalidade e acolhem de boa 
vontade no seu lar e á mesa o hospede que se apre- 
zenta em nome do Senhor. Bessi Samama entrou em 
casa do arabe, e sentou-se á mesa posta para o jantar. 
Sómente o avarento teve o cuidado de collocar sobre 
a mesa um prato cheio de peixinhos minúsculos, e de 
guardar para si n’um prato coberto, o peixe grande 
comprado no mercado. Samama Moysés deitou um 
olhar para o prato coberto, outros para os peixinhos 
que tinha diante de si, comprehendeu o que se tra 
tava, riu, e começou a comer tomando os peixinhos 
um a um, e tirando-lhes a cabeça com dentadas rai 
vosas, fazendo caretas, que chamaram a attenção do 
arabe ingenuo e curioso, e sobretudo, quando viu 
que o hospede, antes de comer os peixinhos, appro- 
ximava-os do ouvido. 
A curiosidade fel-o em breve procurar saber, inter 
rogando-o, ao que o ardiloso judeu respondeu d’este 
modo: 
— Meu pae morreu afogado e o seu cadaver reti 
rado pouco depois do mar, estava meio devorado 
pelos peixes, eis porque eu lhes tenho um odio que 
me faz mastigal-os com tanto furor. 
— Mas — replicou o avarento: — porque os ap- 
proxima do ouvido ? 
— Para ouvir as suas desculpas. Estes pobres pei 
xinhos protestam que são innocentes. Não fomos 
nós, dizem elles, que devoramos teu pae. Somos 
ainda jovens demais, e na época da sua morte, não 
tinhamos nascido. Um dos verdadeiros culpados é 
aquelle peixe grande que se esconde allí dentro do 
prato coberto !... 
O arabe cahindo no laço, levou á mesa o peixe 
grande... Mas desde aquelle dia em diante Bessi Sa 
mama ficou conhecido entre o povo pelo appellido 
do «homem dos peixes >. 
* -é 
Curiosiòabes 
sobre a origem 
ba primeira mulher 
Segundo a mythologia 
phenicia, a primeira mu 
lher foi esculpida em mar 
fim pelo primeiro homem 
e Aphrodite deu vida á 
estatua. 
A lenda grega attribue a creação da primeira mu 
lher a Júpiter. O deus dos deuses ordenou a Vulcano 
que modelasse a mulher em barro, e convidou os 
outros deuses e deusas do Olympo a ornarem a es 
tatua com as suas peiores qualidades. 
Os escandinavos dizem que os tres filhos de Bor: 
Adin, Vill e Ve — passeiando á beira-mar, encontra 
ram dous pedaços de páo : um de freixo e outro de 
olmo. Os tres deuses fizeram com o pedaço de freixo 
o homem e com o de olmo a mulher. 
A lenda mais curiosa e que mais se approxima da 
versão de Moysés, é a dos malgaches. O homem de 
SUPPLEMENTO 
pois de ter provado o fructo prohibido, adoeceu com 
um grande furúnculo na perna. Deste tumor, que 
não tardou a arrebentar, sahiu uma graciosíssima ra 
pariga. Então, o primeiro pensamento do homem foi 
atiral-a aos porcos para que a devorassem; mas de 
pois, por ordem vinda do alto, deixou-a viver e fel-a 
sua mulher. 
Entre os indios da America, as fabulas são tão nu 
merosas como interessantes. Certos povos fazem 
nascer a origem dos nossos primeiros paes da união 
do grão-turco vermelho com o grão-turco branco; 
outros dizem que o homem aborrecendo-se de viver 
só, tomou por mulher a filha do rei dos ratos almis- 
carados; antes de a desposar fel-a tomar banho de 
agua fria. 
ét * 
Amelia AiKisch a muzica é uma tradicção na fa 
milia Nikisch. Arthur Nikisch é 
agora acclamado como um dos maiores senão o maior 
regente da nossa época e sua mulher poz agora em 
scena uma opera em quatro actos: Daniel na cova 
dos leões. O libreto foi escripto por Ernst von Wolzo- 
gen, e a senhora Amelia Nikisch que já é autora de 
uma opereta, Tua Tia, apaixonou-se pelo assumpto 
e a sua musica obteve esta vez completo successo, ao 
contrario da sua primeira opereta que teve um aco 
lhimento muito frio. 
A figura de Daniel não se aprezenta no libreto com 
a austeridade desejada, pois parece mais um cava 
lheiro aventureiro que se serve de estratagemas para 
pôr em ridiculo os assyrio-babylonios. A critica entre 
tanto mostra-se bastante favoravel á musica, e elogia 
especialmente o segundo acto, no qual ha muita me 
lodia e sentimento lyrico. A gentil autora mostrou 
n’essa opera uma veia musical expontânea, escrevendo 
bellas romanças e peças de grande effeito orchestral. 
•fi ê. 
JlllleHé OPOUíf Encontrou-se recentemente um 
maço de cartas que dizem res 
peito a Juliette Dronet, a terna 
e fiel amiga de Víctor Hugo. Orphã, foi educada no 
Petit Plepas, o convento descripto nos Misérables, 
e tornou-se depois pintora de flores, modelo e actriz. 
As suas relações com Hugo datam da primeira re- 
prezentação de Lucrecia Borgia, na qual ella tinha o 
papel de Princeza Negroni. Hugo não era ainda mil- 
lionario e as contas do faux ménage provam uma 
ordem e uma modestia commovedoras. As despezas 
diarias escriptas em tres columnas em francos, soidos 
e centesimos, nunca foram elevadas. E nem também 
as entradas nas quaes se lê por exemplos : 
« Dinheiro para a bolsinha do meu Tótó, 10 fran 
cos ; dinheiro recebido do meu adorado, 55 francos ; 
dinheiro das medalhas da Academia, 36 francos. » 
Depois do golpe de Estado Juliette seguiu Tótó a 
Jersey e a Guernescy, no exilio. Entre as cartas está 
o diario da moça que, parisiense consummada, não 
acha nada que a divirta nas ilhas da Mancha. Quei 
xa-se do asseio e do comfort inglez, protesta contra 
a «beatice protestante». A única pagina alegre é 
a narração de um sonho de Víctor Hugo no qual 
uma noite lhe pareceu estar de volta em Paris e ter 
sido preso por um guarda que se transformava suc- 
cessivamente em gigante, em anão e em ama! 
Dr. Dulcamara
	        
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