SALOMÉ NA ARTE
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De todas as creaturas de legenda, Salomé, filha de Herodiade, é talvez a que
mais tem impressionados artistas.
Na Renascença e no decimo nono século, são poucos os pintores que não inter
pretaram a sua figura extranha.
Entre todas as que crearam os mais bizarros artistas de differentes épocas, a
mais conhecida e admirada é, sem duvida, a de Gustavo Moreau.
ão se pode imaginar a filha de
Herodiade, amante de Herodes,
se não como urna creatura cruel
e de instinctos perversos. Assim
nol-a descreve a poesia de Oscar
Wilde. Entretanto, é verdade que
a mulher, perdida por provar o
frio beijo de Yokanaan degollado, viveu, nou
tros tempos, na imaginação dos artistas, em
diversas attitudes, e que foi interpretada com
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sentimentos bem diversos daquelles com que
hoje somos inclinados a consideral-a. Vemos,
por exemplo, os pintores primitivos imagi-
narem-na sob o aspecto de urna creatura
serena e de olhar puro, de tal modo, que o
seu rosto poderia bem servir de modelo a
uma meiga e casta Madonna.
Nem isso nos deve admirar, pois a sere
nidade angélica é o característico das pin
turas dos primitivos, ñas quaes, de boa von
tade, procuramos descobrir sentimentos que
os auctores não pensaram nunca em expri
mir.
As obscuras incertezas que existem na
historia fabulosa de Salome, permittiram aos
artistas a liberdade de crear um typo á sua
feição, sem o receio de offender á verdade.
Entretanto, podemos dizer que os mais an
tigos fcram também os mais fieis á tradi
ção^ segundo a qual a instigadora do sup-
plicio de João, o precursor, teria dançado
diante do tetrarca na idade de quinze annos.
Os artistas das épocas mais recentes se
guiram, ao contrario, a sua inspiração, e te
mos assim, espalhadas pelo mundo, muitas
Salomes differentes urnas das outras e todas
de diversas idades, visto que ninguem se
preoccupou em reproduzir, nem de longe,
o retrato della, que se suppõe cunhado no
verso de uma medalha de Aristobulo, do
anno 54 depois de Christo. Aristobulo, como
se sabe, é tido como o marido de Salomé
e foi rei da Armenia.
Quem quizesse poderia, em imaginação,
reunir urna bella galeria de quadros e bai
xos relevos reproduzindo com infinitas va
riantes o drama da celebre dançarina. Nem
seria preciso grande trabalho, pois Salomé
triumpha com a sua maléfica seducção nos
pórticos das antigas basílicas, ñas abobadas
de veneráveis baptisterios, ñas paredes de
austeros conventos, nos salões illuminados