Full text: 1.1922,11.Nov.=Nr. 40 (1922004000)

A MAÇA 
11 de Novembro de 1022 
NÃO CORA O SABRE 
DANTAS BARRETO 
De roldão corrí as tropas brasileiras 
que seguiram para o Paraguay em 
1868, ia, como cadete, um menino de 
estatura mediana, imberbe, de pbÁ- 
sionomia carregada, embarcado em 
Pernambuco. Afastado dos companhei 
ros, não se divertia, não tomava 
parte nas festas de bordo, passando 
as horaf^ de mão no queixo, olhando 
soturnamente o mar. No Rio de 
janeiro, de passagem, pouco se incom- 
modára com a terra: anciava por 
chegar aos campos de batalha, onde 
desejava retomar, decidido, o fio do 
seu destino. 
Conduzido ao campo de operações, 
o rapazola, que se chamava Emigdio 
Dantas Barreto, fez questão, logo, de entrar em fogo, 
Seduziam-no os galões alheios, as divisas faiscantes, dos 
generaes gloriosos. 
—- Hei de ser general na minha vida! — dizia, olhando 
a figura severa dos velhos guerreiros, cuja bravura con 
quistava, palmo a palmo, novos terrenos do inimigo' 
Certo dia, nas vesperas de Pirebebuhy, o conde d’Eu 
em cujo corpo servia, distribuiu-lhe uma delicada missão : 
— O senhor vae postar-se á margem do córrego, em 
observação. Ao menor movimento do inimigo, retroceda, e 
communique-me. 
Dantas Barreto dispensou as praças que lhe queriam dar 
para defeza, amarrou bem o cinto, reforçou a espada, 
poí: o fuzil a tiracolo, e desappareceu no màttagál: A’ 
noite, não voltou. No dia seguinte, quando já o suppunham 
morto ou aprisionado, chegou, suado, roto, no acampamento 
brdsileiro. \ I j j 
— Então, perdeu-se no matto? 
Dantas fechou a cara, soturno, e explicou. Estava de 
vigilancia no ponto indicado, quando vira chegar um 
soldado paraguayo, com uma caixa de madeira. Prestou 
attenção, e viu: era o frueto de um iroabo, que o 
bahdido ia esconder. Certo de que se tratava de uma 
deShonestidade, o cadete brasileiro pulou, como um tigr^.. 
sobre o individuo, subjugando-o. 
— Que é isso, miserável? 
O soldado, attonito, caliiu de joelhos, confesando a sua 
falta. A caixa pertencia ao seu coronel, que elle havia 
roubado. ■ l í 
— E onde está o acampamento ? 
— D’aqui a duzentos metros, ao pé da collina. 
— Vamos lá. 
O soldado na frente, com 
a caixa de moedas, e elle 
atraz, com o dedo no gatilho 
da pistola, embaraíustou Dantas 
Barreto pelo arraial inimigo, 
pedindo que o le/assem ao 
commandante, ao qual narrou 
o o .'corrido O official paraguayo 
apertou-lhe a mão, agradecido, 
offereceu-lhe um li/ro com 
dedicatoria, forneceu-lhe um 
mappa da região, e mandou 
reconduzil-o, no dia seguinte, 
pté a margem do corrego, com 
a tropa formada, áo som de 
duas bandas de musica. 
Terminada a guerra, em 
que praticou os maiores actos 
de bravura, regressou Dantas 
Barreto á córte, no posto de 
po 
a 
se 
v- 
tenente. O seu ■ nome 
era citado, nos quar 
téis, como b de um 
offi.ial decidido, va’en- 
te, corajoso, desses que 
se deixam malar, mas 
não recuam. 
Pouco affeilo ao 
sedenlarismo, o \ àloroso 
soldado quiz aprdveitar 
os vagares da paz, 
nos quartéis, para um 
novo acto d-- bravUra. 
Abriu o volume que o 
coronel paraguayo lhe 
liavid dado, e ccmfeçou a traduzil-o. Era uma novella 
tragica, denominada, no original, «La butaca», e que 
recebeu, na traducção brasileira, o titulo de «A Princeza 
Herminia». ' 
Um erro de paginação, feita longe do traductor, fez 
com que a critica do; tempo tornasse Dantas .Bar 
reto como autor ~da obra, atacando ' pela medio- 
cridado do trabalho. ' «A Princeza Herminia» — es- 
Crevia • tachado de. Assis nos seus folhetins 
• << ^ aZetax ’- ® 11111 drama impressionante, óu 
me hor, uma catastrophe. É’ a historia de um ciumento 
-na sua furia dé destruição, liquida toda a família». E 
concluía, com aquella sua 'ironía irico.nfundivel: «Nessa 
obra, morre até o autor». 
Orgulhoso demais para defender-se de accusaçõéS que 
lhe não cabiam, deixou o officiâl brasileiro que os ataques 
eorresem mundo, assumindo a Responsabilidade do delicto 
literario. Como vingança, abándônòü, põrém, a vida _ de 
letras, passando a tratar Exclusivamente de questões milita- 
ies, trabalhando, com afinco, peló prestigio, pelo engran 
decimento é pela unidade da classe. 
De posto em posto, de commissão ém comtiiissão, occupan- 
do-se devotadamente como preparo dà tropa, chegou Dantas 
Barreto com os ga'ões de major, â presidencia de Prudente 
de Moraes, quando foi mandado, com o Exercito Nacional, 
para a fogueira de Canudos. 
A sua coragem, mascarada pela melhor serenidade, 
conseguiu prodigios, no sertão bahiano. Commandante de 
um batalhão de pernambucanos, sustentou fogo com os 
jagunços um dia e uma noite* sem coiRiér' nem beber. . E 
quando voltou de lá, no posto de còronel, ‘ foi para 
escrever, cómò Xenophonte,' a historia, d’áqbella expedição me 
morável, cujas origens e designios não fôram, até hoje, 
esclarecidos. : ■ 
.listava Dantas Barreto cqm os 
seus, seis galões,- quando' assu- 
m ‘u ...° governo o conselheiro 
Rodrigues Alves. A fama de 
soldado corajoso e de republi 
cano sincero, alhada á confiança 
que. nelle depositavam os ch e fes 
da política nacional, indicaram-no 
naturalmente para uma das mis 
sões mais delicadas que apparece 
ram naqucPe quati ienn o: o re tabe-' 
lecunentó da ordem legal em Matto- 
\ Grosso, onde a cpposição, em movi- 
mentò victorioso* havia deposto Ó 
presidente Paes dè Barros. Chegan 
do tarde, pois que o presidente ha i i 
sido assassinado nas vespêrãs 
seu desembarqué em Corumbá,. 
Dantas Barreto repetiu, intran- 
f
	        
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